Nos últimos dias, o caso da atriz Klara Castanho ganhou destaque nos jornais, sites e canais de notícias. A jovem de 21 anos engravidou após ser vítima de um estupro e optou por entregar o bebê para adoção, dentro dos trâmites legais existentes. Segundo o relato da atriz, os dados sensíveis foram vazados para colunistas, ainda durante a internação, por parte de uma enfermeira do hospital.
Esse fato serve de alerta para médicos e todos da área da saúde: o cuidado com o vazamento de informações.
Praticamente em todas as nossas transações, sejam elas do dia a dia ou não, temos que deixar alguma informação pessoal ou lidar com os dados sensíveis de outra pessoa. Até mesmo a compra de um simples cafezinho envolve esse tipo de compartilhamento.
No on-line, por exemplo, é impossível conseguir fazer uma compra de um produto ou serviço, sem fornecer informações sobre você. Nesses novos tempos, os dados se tornaram uma moeda de troca para algumas empresas, chamando a atenção também de hackers e golpistas.
Na área médica, essas informações muitas vezes íntimas também são naturalmente captadas e registradas por médicos e outros profissionais de saúde que têm acesso a dados pessoais relacionados à saúde dos pacientes. Vale lembrar que, por lei, esses são dados sensíveis.
Além dos deveres decorrentes do sigilo profissional, característico da profissão médica, todas as informações dos pacientes que o médico e a sua equipe têm acesso, são protegidas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e devem ser tratadas como a legislação determina.
Em vigor desde 2020, a LGPD trouxe definições e hipóteses de como os dados pessoais devem ser tratados. Com ela, foi criada a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), cujo objetivo é fiscalizar e auxiliar no controle da segurança dessas informações, sejam elas sensíveis ou não.
Desde o advento da Lei, um dos setores que mais recebeu enfoque foi a saúde. Na medicina, a LGPD reforça as regras de sigilo profissional, próprias da profissão e dispostas no Código de Ética Médica, e parametriza as hipóteses e como os dados podem ser tratados.
Como explica a advogada especialista na área da saúde, Bruna Soares:
“Mesmo antes da LGPD, as informações tratadas pelos médicos e profissionais da saúde em geral já eram protegidas pelo dever de sigilo profissional. Agora, além dos cuidados inerentes à profissão, o profissional deve ficar atento também às diretrizes da lei e adotar todos os cuidados para evitar qualquer tipo de vazamento ou exposição de informações. Além das penalidades éticas e penais já conhecidas, podem potencializar o risco de indenizações no âmbito civil e gerar pesadas multas administrativas ao profissional autônomo, clínicas ou hospitais.”
A preocupação com a proteção de dados é há muito tempo discutida na sociedade. A LGPD ampliou ainda mais a discussão, porque deu corpo a todo um sistema de proteção legal às informações pessoais diariamente operacionalizadas.
Após ela, vieram mais normas e instruções sobre como proteger e garantir o sigilo dos dados.
Por exemplo, em janeiro deste ano, comentamos aqui mesmo no blog, sobre a nova “Lei da Saúde” (Lei 14.289/22), que também tem como objetivo proteger os dados sensíveis de pessoas com algumas doenças em todos os ambientes, não só o da saúde, mas em escolas, trabalho e outros locais.
Nenhum sistema é inviolável, mas algumas medidas podem ser tomadas para dificultar o vazamento e reforçar a relação e a confiança entre médico e paciente.
Controle quem tem acesso aos dados dos pacientes
Os dados sensíveis (informações sobre a condição de saúde do paciente, sua genética, vida sexual, relatos de sintomas etc) precisam de maior atenção. Portanto, é importante controlar o acesso a essas informações entre as pessoas da equipe. Dê acesso aos dados somente o pessoal fundamental para a sequência do atendimento, dentro de suas aptidões e funções.
Deixe o paciente ciente do porquê pedir essas informações
O esclarecimento do fornecimento de determinado dado e a garantia de que o relato ficará em sigilo reforça a confiabilidade (a confiança é o princípio que rege a relação médico-paciente), independentemente de qualquer procedimento feito.
Atenção para o compartilhamento de exames e hipóteses diagnósticas
Durante o período de pandemia, essa prática tornou-se ainda mais comum. O recomendado é evitar ao máximo o compartilhamento de informações com pessoas estranhas à relação médico x paciente.
Se for o caso, tenha certeza de que sempre há a anonimização e restrição de qualquer dado que possa identificar o paciente ou o caso, sempre em canais seguros de transmissão.
Atenção para conformidade à Lei Geral de Proteção de Dados
Todo banco de dados deve se adequar à LGPD e suas normativas. Nem sempre será simples, mas a adequação trará ao médico segurança contra implicações éticas-médicas, além de protegê-lo de sanções penais e civis por vazamentos e compartilhamentos indesejados de informações.
Embora o sigilo das informações seja a regra, o próprio Código de Ética Médica prevê situações em que o profissional possa ceder dados confidenciais (por lei, sensíveis), especialmente quando existir alguma implicação ou dever legal. Veja alguns exemplos:
Nem sempre as ações necessárias para a garantia do sigilo e os limites do profissional quanto ao compartilhamento são simples de serem interpretadas. Consulte um especialista que compreenda as necessidades da área médica para orientá-lo.
Zelar pelos dados é ter um cuidado ainda maior com o paciente, com a reputação profissional e dos riscos inerentes à profissão. Ainda, tem o poder de estreitar as relações de confiança entre os envolvidos.