O aborto legal no Brasil é um procedimento médico realizado com objetivo de interromper uma gestação, em algumas situações autorizadas pela legislação brasileira, e que deve ser oferecido de forma gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Como muitos médicos e outros profissionais da área da saúde sabem, ele é permitido somente em três situações:
É importante ressaltar que a gravidez decorrente de estupro envolve também situações em que não há necessariamente violência física. Por exemplo, quando o parceiro retira o preservativo sem o consentimento. E mais, considera-se estupro todo e qualquer ato sexual não consensual.
Mesmo assim, ainda existem muitos casos no Brasil em que nem mesmo diante dessas três situações previstas em lei o procedimento é realizado.
Quais instituições devem realizar o procedimento?
Por lei, qualquer hospital que possua área para atendimento de obstetrícia e ginecologia precisa contar com equipamento adequado e uma equipe multidisciplinar treinada com capacidade para realizar o aborto legal.
Contudo, nem todos os hospitais estão preparados para realizar o procedimento. Nesses casos, o encaminhamento para o serviço de referência mais próximo é direito da mulher.
Existe um tempo limite de gestação para realizar o aborto de forma legal?
A legislação brasileira não prevê qual o tempo máximo. No entanto, as Normas Técnicas de Atenção Humanizada ao Abortamento e de Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual contra Mulheres e Adolescentes, ambas do Ministério da Saúde, dizem que o procedimento pode ser realizado até 20ª semana de gestação, sendo estendido até 22 semanas ou caso o feto tenha menos de 500 gramas.
Legalmente, em tese, essas normas não têm o poder de se sobrepor à legislação. Neste caso, elas devem ser consideradas uma orientação do Ministério da Saúde.
Quais os documentos necessários para a realização de um aborto legal?
Importante, ainda, que seja obtido da paciente um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para respaldar a atuação dos profissionais.
O que diz o Código Penal e demais legislações brasileiras?
O Código Penal Brasileiro, de 1940, caracterizou o crime de aborto, prevendo punições às mulheres e médicos que o cometam. A única exceção prevista na Lei é a possibilidade de aborto legal em casos de estupro.
Do ponto de vista do profissional de Medicina, persiste uma certa insegurança sobre como agir diante de uma solicitação de aborto, ainda que a paciente tenha respaldo legal. Então, o que fazer diante dessa situação?
A importância do sigilo médico
Assim como o Conselho Federal de Medicina (CFM), o Código Penal Brasileiro também ampara a paciente na questão do sigilo sobre o procedimento. Além de sigilo profissional, a LGPD também protege a mulher contra a exposição de dados sensíveis e resguarda o direito de acesso à saúde e segurança nos procedimentos e proteção contra casos de negligência médica.
Por força do dever de sigilo profissional e normas que impõem o dever de sigilo, cabe aos médicos atuarem dentro dos limites éticos e legais da profissão, respeitada a autonomia da paciente.
“Medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza; o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional.”
Fonte: Capítulo I dos Princípios Fundamentais da Medicina, inc. I e II, no Código de Ética Médica
Recusa na realização do ato médico
Importante ressaltar que é direito do médico recusar-se a realizar atos que sejam contrários aos ditames da sua consciência, mesmo que sejam atos autorizados por lei. Ainda, é direito do profissional ter condições dignas do exercício da profissão, podendo ele recusar-se a realizar o procedimento, caso verifique se há risco à sua saúde ou da paciente.
Porém, o profissional deve ter atenção ao negar o procedimento. Sua recusa não pode trazer prejuízo à saúde ou risco de vida da paciente por sua ação ou omissão.
Segundo dados do Sistema Único de Saúde (SUS), 40% das mulheres que fizeram um aborto autorizado por lei no Brasil, entre janeiro de 2021 e fevereiro de 2022, realizaram o procedimento fora do município onde moravam.
Os motivos do deslocamento são diversos, mas o fato é que muitas mulheres têm dificuldades em ter acesso ao direito ao aborto seguro e legal. Em alguns casos, por entraves dos próprios profissionais e serviços médicos que se sentem despreparados ou desconhecem as normas, temendo ficarem vulneráveis à sanções éticas e penais, ou ainda associam a prática a questões sociais.
De acordo com levantamento feito pela Organização Mundial de Saúde (OMS), 73,3 milhões de abortos seguros e inseguros foram realizados anualmente entre 2015 e 2019. Na América Latina, 3 em cada 4 abortos são feitos de forma insegura.
No Brasil, o aborto inseguro segue como uma das principais causas de morte materna, quando acontecem por problemas ligados à gravidez ou são agravados por ela. Essas causas normalmente acontecem durante o período de gestação ou até 42 dias depois do parto.
A melhor proteção para o profissional de medicina é o conhecimento. Não apenas relacionado à ciência médica, mas também sobre seus deveres e direitos, essenciais para o exercício ético do seu trabalho. Por isso, busque orientação adequada e especializada para se precaver e, caso seja necessário, se defender.